Robertson Frizero

Escritor, tradutor, dramaturgo e professor de Criação Literária

Sabemos que na escrita ficcional há personagens planos” (menos complexos) e “redondos” (aqueles que damos maior profundidade). Estes últimos exigem mais de nós escritores, pois requerem personalidades mais complexas, isto é, com contradições e tensões que os tornam mais relevantes na trama.

A consciência desses personagens é a chave para que possamos adentrar seu “interior”. Isso pode até não nos servir para compreendermos as razões – ao menos inicialmente – para um determinado comportamento, mas nos ajudar a explicar e tornar verossímil porquê os personagens agem como agem.

Acompanhe-nos nesta jornada que tem como guia o livro Como funciona a ficção, de James Wood.

Uma tradição multimilenar do solilóquio

Uma das principais maneiras de trazer à tona a consciência de um personagem é por meio do solilóquio, ato de alguém conversar consigo próprio. Esta tradição remonta, por exemplo, ao Antigo Testamento, texto sagrado judaico-cristão com cerca de cinco mil anos.

Nos textos laicos, isso aparece desde Shakespeare, passando ainda, por escritores como Charlotte Brontë e Thomas Hardy, em seus romances do final do século XIX (WOOD, 2012). Estes, apresentavam os personagens falando sobre si próprios em longos solilóquios.

Não há forma de dar a ver a consciência de um personagem senão por meio de um narrador, seja ele confiável ou não, em primeira ou terceira pessoa. Por isso, é importante dar materialidade às idiossincrasias dos personagens por meio do texto.

Denzel Washington interpretando, no cinema, Macbeth
Denzel Wasshington no papel de Macbeth (Imagem: Divulgação do filme The tragedy of Macbeth)

Memória como castigo à consciência

Macbeth, de Shakespeare, é uma peça que nos convida a pensar a memória não somente como algo idílico e libertador, mas justamente o contrário, como sofrimento e prisão. Isso fica claro quando o protagonista afirma “Minha mente se ocupava/com coisas esquecidas”.

Ora, o que essa frase faz é trazer à tona a consciência culpada de Macbeth, cuja maldição não é propriamente metafísica, não tem a ver com os fantasmas e as feitiçarias – o que fica sugerido numa leitura mais superficial –, mas com um certo tipo de “maldição mental”, daquilo que vive na memória.

As três camadas da consciência de Raskólnikov

Romancistas russos, especialmente os da segunda metade do século XIX, estão entre os grandes narradores da consciência humana. Dostoievski ou Tolstói figuram entre os gigantes da narrativa ficcional de todos os tempos. Para finalizarmos esse texto, recorreremos a Rodion Românovitch Raskólnikov, personagem principal da obra Crime e castigo.

Breve contexto de Crime e castigo

Para quem não conhece o romance, é preciso dizer quem é Raskólnikov é um jovem ex-estudante vivendo em extrema miséria na cidade de São Petersburgo, Rússia. Certo dia, atormentado diante da situação miserabilidade, ele mata a velha que alugava o quarto onde vivia com o desejo de usar o seu dinheiro que ela tinha para “boas causas”, segundo sua própria teoria.

Crime e Castigo, obra de Dostoievski
Imagem reproduzida do site JusBrasil

Três camadas da consciência

James Wood (2012, p. 133-134) chama atenção para três camadas de consciência, que poderíamos também chamar de três “dimensões”, que ajudam a explicar profundidade mental de personagens como Raskólnikov.

Na primeira camada, digamos assim, a dimensão consciente do crime está expressa nas várias justificações que o personagem dá para o assassinato da velha, incluindo as compensações financeiras que seriam aplicadas em “boas causas”. Essa é a camada mais superficial da consciência.

Uma segunda camada tem a ver com a motivação inconsciente em cometer o crime. É típico da confusão mental da culpa que resulta em transformar amor em ódio e coisas do gênero. Esses sentimentos exacerbados surgem por uma culpa que nem mesmo Raskólnikov sabe bem porquê a tem.

Uma terceira camada, esta mais profunda, é aquela que não pode ser compreendida por explicações, mas por termos de fanatismo religioso, no sentido de abandonar a tentativa de explicações racionais ou psicológicas, tendo como único fundamento algo que é alheio ao próprio sujeito.

Paradoxalmente, neste último caso, os personagens agem para que sejam conhecidos e julgados por terem uma alma e uma consciência abjetas. O paradoxo está além de saber o que é o mal e mesmo assim praticá-lo, mas justamente porque a camada mais profunda da consciência se expressa como inconsciência.

Clube de Criação Literária

Clube de Criação Literária é uma dessas ações de mecenato coletivo – neste caso, em favor do escritor e tradutor Robertson Frizero. Mas, como o próprio nome sugere, é uma ação de mecenato que traz, também, uma ideia inovadora no campo da formação continuada em Escrita Criativa.

Programação de maio do Clube de Criação Literária

A programação traz, em dias alternativos, alguns encontros já ministrados e que foram solicitados por vocês para uma reedição.

Esses cursos serão abertos ao público em geral, mas para afiliados do CCL há um desconto de 60% no valor. Caso indique um aluno para o curso que efetive sua matrícula, o afiliado ganha bolsa integral na atividade. O primeiro tema será a Escrita de Roteiros Audiovisuais.

Programação Clube de Escritores - Robertson Frizero
Programação Clube de Criação Literária – Robertson Frizero
Programação oficina de Roteiros Robertson Frizero
Programação oficina de Roteiros Robertson Frizero

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Roberson Frizero é escritor, tradutor, dramaturgo e professor de Criação Literária. É Mestre em Letras pela PUCRS e Especialista em Ensino e Aprendizagem de Línguas Estrangeiras pela UFRGS. Sua formação inclui bacharelado em Ciências Navais pela Escola Naval (RJ). Seu livro de estreia, Por que o Elvis Não Latiu?, foi agraciado pelo Prêmio CRESCER como um dos trinta melhores títulos infantis publicados no Brasil. Seu romance de estreia, Longe das Aldeias, foi finalista do Prêmio São Paulo de Literatura, do Prêmio Açorianos de Literatura e escolhido melhor livro do ano pelo Prêmio Associação Gaúcha de Escritores – AGES. Foi, por três anos consecutivos, jurado do Prêmio Jabuti, da Câmara Brasileira do Livro – CBL.

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